Eu Já Estive Em “O Convidado”, de Henrique Lui

Fala gente, tudo bem? Dessa vez a influência da literatura russa bateu forte por aqui. Entre os clássicos russo que já li, não teve como não conectar nossa última leitura coletiva com Ana Karenina, de Liev Tolstói. A dramaticidade, o mundo acabando a cada acontecimento que marcava a família, aquela depressão intensa sem a vontade de encontrar uma luz no fim do túnel para viver. Foi assim que eu me senti na leitura de “O Convidado”, de Henri Lui, em especial no que diz respeito à Natália e na parte da história que diz respeito a ela.
Mas, o protagonista aqui é Xavier, ou Fiódor, ou… enfim. Em alguns momentos até achei que poderia ser uma pessoa com múltiplas personalidades, mas não, ele faz tudo pensado e arquitetado, então, sim, temos um protagonista vilão na história. Ele não teve uma infância feliz, se é que teve uma infância, o que justifica ser alguém extremamente complicado.
Xavier se desentende com o pai, o que resulta desse desentendimento o faz mudar de cidade, matar pessoas, ser quem não é, enganar alguns, se apaixonar por outros, mudar de cidade de novo… Ele devia ter muita coisa guardada dentro dele desde sua infância, mas, enfim, vai desencadear em muitas decisões que, no meu ponto de vista, podem ser equivocadas. A forma como ele chega atrasado e se senta na janela na família de Ivan e Natália é bem coisa de romance russo, todo o drama que ele carrega e repassa para toda a família também. É quase que como uma nuvem carregada de chuva seguindo todos que moram na casa. Mas, ele se insere bem no contexto e vai refazer sua vida com tudo o que tem direito, se preparem.
O livro é dividido em 10 partes, para mim cada uma diz respeito a um pensamento sobre o que Xavier planeja fazer da vida, mas isso é bem aleatório da minha cabeça mesmo. É porque Xavier tem tantas camadas que associei a pelo menos 10, as 10 partes do livro, que é muito bem diagramado e com uma qualidade editorial bem boa.
“A cada nova perda, Ivan tentava soerguer-se em desespero, como se uma moral defendesse, e muito mais perdia.”
“O crescimento dos filhos aos olhos dos pais é imperceptível muitas vezes, e o foi para Natália em absoluto.”
“O clima mudava tudo, todos: sua radiação, sua claridade, seu calor contagiavam com o mais simples respirar. E era impossível evitá-lo como o é respirar.”
“Não tinha o costume de rir pela manhã, parte do dia em que tudo lhe parecia tragédia, inclusive sua própria vida.”
Sinopse: “Todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira”.
Assim começa um dos mais célebres romances da história, Anna Kariênina, de Liev Tolstói.
Essa talvez tenha sido uma inspiração, quem sabe, para a história de “O Convidado”.
Duas famílias, de mundos completamente diferentes, que vivem suas tragédias cada uma à sua maneira, mas entrelaçadas por uma personagem em comum, que, por fatalidade ou destino, as une. Assim se passa “O Convidado” – título irônico para o segundo romance de Henri Lui. Xavier, movido por uma fatalidade, deixa a casa de seus pais e, a partir daí, se desenrola a história da família Marah. Ivan, seu patriarca, é um Desembargador corrompido por dívidas de jogo, ou simplesmente por uma necessidade de estímulos em sua vida, alheia que foi, até então, a qualquer dificuldade ou percalço. Traição, desilusão, sofrimentos, amores, vinganças… toda sorte de acontecimentos é colocada na grande mesa de jantar dos Marah, para deleite de suas porcelanas, que aguardam “ansiosas por seus pratos”. A história começa, justamente, através da perspectiva destas porcelanas (como se dotadas de sentidos), colocando a família Marah como “objeto” de deleite, deliciando-se elas com as excentricidades humanas vindas daquelas personagens ali sentadas. O rumo dos acontecimentos não deixa o leitor entediado. Ao contrário: a curiosidade é uma constante que envolve a trama, cujo final, ou não final, prima pela sua originalidade, deixando o leitor com uma sensação de que, embora terminado o livro, a história continuará. Ao menos em sua memória. Parágrafos refinados, personalidades complexas, e dez partes da história, divididas em dois tomos, tornam o romance obra fácil de se ler. O Convidado é uma obra vivida em tempo indeterminado e em cidades criadas pelo Autor, que consegue, mesmo em centenas de páginas, não situá-la, nem no tempo, nem no espaço – o que apenas aguça a curiosidade já despertada pelos capítulos que a compõem. Um história singular nos dias de hoje, que abraça o romantismo do Século XIX, e, atreve-se a dizer, flerta com características da Rússia, país cujos escritores, como reconhecido pelo próprio Autor, estão entre seus favoritos, mas que, ao mesmo tempo, tem em sua escrita uma marca contemporânea única que deixará o Leitor, no mínimo curioso ou intrigado, mas que, seguramente, não o fará indiferente a tantos infortúnios.
Boa leitura e divertimento com as excentricidades expostas às porcelanas na grande mesa da Mansão dos Marah!
Sobre o autor: Nascido em Araraquara, em São Paulo, Luiz Henrique Marquez assina com o pseudônimo Henri Lui e tem dois livros publicados. “J.” marcou sua estreia na literatura e conta com elementos autobiográficos. O segundo lançamento é O Convidado, publicado pela Frieden Editora. Depois de se formar em Direito, mudou para São Paulo, onde se tornou Procurador do Município. Desde pequeno, a inquietação diante de um papel em branco o levou, inconscientemente, a escrever. Canções, poemas, contos e crônicas eram espalhados por cadernos e folhas, a esmo. A biblioteca da casa dos pais, fruto da formação em letras de sua mãe, o colocou em contato com a literatura, mas foi nas ricas conversas com o primo – hoje professor de letras da Universidade de São Paulo (USP) – que a sua paixão tomou forma.
“O Convidado”, de Henri Lui, tem 351 páginas e está à venda no site da editora no formato impresso (https://loja.umlivro.com.br/o-convidado-6978396/p) e na Amazon no formato digital. Para quem for assinante do Kindle Unlimited, é parte do catalogo dos livros disponíveis 😊
Janaína Leme